domingo, 6 de outubro de 2013

“El asentamiento fenicio más occidental de la historia está en Ayamonte”?! Não, não está...


“El asentamiento fenicio más occidental de la historia está en Ayamonte”?! Não, não está…

 

Foi no passado dia 12 de Setembro de 2013 que o jornal espanhol La Vanguardia publicou uma notícia intitulada “El asentamiento fenicio más occidental de la historia está en Ayamonte”. Segundo este órgão de comunicação, os especialistas do Instituto Arqueológico Alemão afirmaram tratar-se do assentamento fenício mais ocidental da História, avançando uma cronologia de 2800 anos para datar o sítio arqueológico em questão. Ora, estas declarações não só são altamente contestáveis, como traduzem um brutal desconhecimento dos estudos arqueológicos que, nas últimas décadas, têm vindo a ser realizados em Portugal.

A directora do Instituto, Dirce Marzoli, ainda referiu que em alguns pontos de Portugal foram encontrados vestígios que indicam uma possível ocupação fenícia. Possível?! Ora, não saberá a senhora que na outra margem do Guadiana, em Castro Marim, foi identificado um assentamento fenício e que já deu origem à publicação de vários trabalhos científicos? Isto já para não falar de outros sítios em contexto algarvio – a ocidente de Ayamonte – como Tavira ou do Cerro da Rocha Branca, em Silves. De resto, a presença fenícia no ocidente peninsular está também atestada noutros pontos correspondentes ao território português. É o caso de Alcácer do Sal, Setúbal, Abul, Almaraz, Santa Olaia, para além dos materiais identificados em Conímbriga e que atestam as relações que a população autóctone que ali habitava mantinha com o mundo fenício.

Ao que parece, continua a subsistir, em alguns círculos, a errónea ideia da inexistência de estabelecimentos fenícios a ocidente de Cádiz. Muitas declarações, de alegados entendidos na matéria, omitem estudos recentes, esquecem trabalhos pioneiros de portugueses ou, na melhor das hipóteses, explicam os testemunhos arqueológicos disponíveis no extremo ocidente da Península num contexto de relações comerciais pontuais e muito esporádicas. Como exemplo podemos apontar a obra dirigida por Olmo Lete-Eugénia, editada em 1987, “Tiro y las Colónias Fenicias de Occidente”, onde nem sequer é considerada tal presença no território português. A verdade é que moderna investigação portuguesa tem vindo a demonstrar a inequívoca presença de estruturas comerciais e o forte impacto cultural fenício, desde o estuário do rio Guadiana ao rio Mondego. Nesse sentido, alertamos para a falta de rigor científico de alguns artigos avançados pelos órgãos de comunicação. Não nos devemos esquecer que o mediatismo em torno de alguns estudos arqueológicos são fundamentais para que os mesmos não morram na praia…

 

Jornal do Baixo Guadiana, Nº159, Outubro de 2013, p.21.