As investigações da
arqueóloga Teresa Gamito, reputada professora e investigadora conhecida
internacionalmente, em muito contribuíram para aprofundar o nosso conhecimento
acerca da história das várias civilizações que, desde a proto-história,
habitaram o espaço geográfico correspondente à actual cidade de Faro.
Estas investigações
começaram em Abril de 1984, com uma escavação de emergência no cemitério romano
na Rua das Alcaçarias que, naturalmente, vieram a comprovar a riqueza
patrimonial e arqueológica existente no centro histórico da cidade. Os anos que
se seguiram foram pautados por várias escavações no centro Histórico de Faro,
nomeadamente na Horta da Misericórdia, junto ao Museu Municipal, entre 1993 e
2001. Entre o espólio arqueológico recolhido da Horta da Misericórdia
encontram-se inúmeros materiais representativos da presença islâmica na cidade,
nomeadamente, cerâmicas de grande interesse e até um fragmento de candelabro de
mesquita! As estruturas descobertas revelam um bairro islâmico com uma
utilização criteriosa do espaço; casas simples e pequenas, ruelas estreitas e
algumas dependências de utilidade pública, nomeadamente uma cisterna com a sua
área de lavagem de roupa e um lagar.
No entanto, não obstante
a importância destas descobertas arqueológicas e o impacto que estas poderiam
ter no âmbito do turismo local, é intenção da Câmara Municipal de Faro
aproveitar a chamada Horta Misericórdia para criar 12 hortas de 40 metros
quadrados! Segundo a autarquia, o objectivo passa por fomentar a agricultura
biológica e chamar a atenção para as questões ambientais nas cidades. Ora, é
absolutamente inconcebível que a escolha do local para tão ecológicas
preocupações recaia exactamente num local de inquestionável valor histórico e
patrimonial. Os americanos, mais pobres que os europeus no que se refere ao
património, compram claustros inteiros e reconstroem-nos na América. Nós, que
temos património, temos destas atitudes incompreensíveis, típicas de um país
subdesenvolvido em que as querelas partidárias se sobrepõem aos valores
defendidos na própria Constituição da República! É lamentável que nenhum dos
autarcas que, ao longo de 20 anos passaram pela Câmara de Faro, tenham
compreendido que seria do interesse estratégico da autarquia e dos empresários
farenses, a aposta na reabilitação do sítio arqueológico da Horta da
Misericórdia, tornando-o visitável e fomentando assim o turismo cultural na
capital do Algarve.
No final acabamos todos
por perder: perdem os turistas por se verem privados de visitar um sítio de
inquestionável interesse histórico, perde o comércio e a restauração por verem
o negócio privado do turismo e perdemos todos nós que ficamos ainda mais pobres
do ponto de vista histórico, cultural e patrimonial. E que ficamos a ganhar? Um
par de couves e cenouras…
Jornal do Algarve, nº2801, 02 de
Dezembro de 2010, p.16.
1 comentário:
http://www.jornaldoalgarve.pt/fernando-pessanha-2/
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